UNIDADE 2 | CAPÍTULO 4
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Neste capítulo estudaremos

RETRATOS AMBIENTADOS: DE ARNOLD NEWMAN AOS DIAS DE HOJE
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Retratos ambientados: de Arnold Newman aos dias de hoje

Um retrato ambientado é uma fotografia de uma pessoa em um ambiente específico: seu local de trabalho, sua casa ou qualquer lugar relacionado a quem ela é; de certo modo, um retrato ambientado é mais sobre o que a pessoa faz do que sobre quem ela é.

Retratos ambientados são uma maneira rápida de transmitir muitas informações sobre alguém que em um retrato feito em estúdio com fundo simples você não conseguiria ver. Jornais e outras publicações adoram esse tipo de foto, porque chamam a atenção do leitor mais rapidamente que os retratos padrão. Por exemplo: um homem de jaleco pode ser encaixado em diversas profissões, porém um homem de jaleco com um estetoscópio no pescoço e parado no meio de um picadeiro sugere que ele é o médico de um circo.

Provocação
Provocação

Retrato ambientado x Foto de personalidade

Fotos de personalidade – como as imagens feitas em ensaios de celebridades – são, frequentemente, confundidas com retratos ambientados. Ainda que existam semelhanças entre os dois gêneros, eles se diferem em aspectos essenciais: enquanto o retrato ambientado costuma enfocar a ocupação ou situação do sujeito retratado, a foto de personalidade usa adereços e figurinos para descrever a personalidade da pessoa fotografada. Embora o resultado final seja frequentemente muito parecido, os retratos ambientados são mais sobre os arredores do que o clima da foto, o oposto exato de uma foto de personalidade.

Figura 45. Exemplo de foto de personalidade. Foto de John Ray.

Fonte: https://www.pexels.com/photo/woman-in-brown-wedding-gown-and-winter-landscape-background-3863802/.

T1. Arnold Newman, o pai do retrato ambientado

“Um artista de verdade é alguém que pode nos mostrar nossos velhos e familiares mundos de um jeito novo e diferente que nunca vimos nem ouvimos falar antes”. (NEWMAN apud MIRANDA, 2020).

O fotógrafo norte-americano Arnold Newman é figura notável na história da fotografia e do fotojornalismo. Consagrado como retratista, Newman praticamente criou um gênero de retrato: o retrato ambientado.

Expandindo os limites da fotografia de retrato tradicional, Newman acreditava que, para criar um retrato verdadeiramente perspicaz, todos os aspectos da imagem – e não apenas a pessoa – deveriam ser considerados. A partir dessa ideia, ele usava o ambiente como fonte de informação sobre a vida e o trabalho de seus modelos. Em suas próprias palavras, “não queria apenas fazer uma fotografia com algumas coisas em segundo plano. O ambiente tinha que aumentar a composição e a compreensão da pessoa. Não importava quem era o sujeito, tinha que ser uma fotografia interessante.” (NEWMAN apud MIRANDA, 2020)

A carreira de Newman começou em 1938, quando ele começou a fazer experiências com sua própria fotografia documental, enquanto trabalhava em vários estúdios de retratos na Filadélfia, Baltimore e West Palm Beach. No final de 1941, o nome de Newman se infiltrou na cena artística de Nova York. Ganhando reconhecimento rapidamente por seus retratos de sitters famosos, particularmente artistas, ele logo começou a trabalhar para publicações como Fortune, LIFE e Harper's Bazaar.

A maioria dos trabalhos de Newman era o resultado de uma interação social prolongada com o sujeito. Para o fotógrafo, não era difícil interagir com seus modelos – fossem eles artistas famosos, presidentes ou ganhadores do prêmio Nobel. Atribuía essa habilidade de conversar e interagir naturalmente com pessoas ao fato de ter trabalhado quando criança em um hotel.

Uma de suas fotografias mais conhecidas é o retrato do compositor russo Igor Stravinsky. Em uma composição minimalista, o objeto que descreve profissão do retratado – um piano de cauda – ocupa o centro do quadro, quase preenchendo toda a imagem, enquanto o próprio Stravinsky senta-se no canto. A composição dessa imagem é um exemplo de como o fotógrafo usava elementos de design gráfico: aqui, ele encena a imagem de modo que a tampa do piano perca sua profundidade, assumindo uma forma abstrata semelhante a uma nota musical, que paira dramaticamente sobre o compositor. A imagem foi tirada com uma câmera de grande formato e bastante cortada, como podemos ver na folha de contatos – a impressão da sequência de imagens produzidas ao longo da sessão. Newman escolheu a última imagem da folha de contato, disponível no link: https://flaxart.com/product_images/uploaded_images/igor-stravinsky.jpg.

Figura 46. Folha de contato mostrando o processo de criação do retrato de Stravinsky por Arnold Newman. Observe o recorte na imagem escolhida (a última da folha de contato).

Fonte: https://pixls.us/blog/2016/10/arnold-newman-portraits/Igor%20Stravinsky%20contact.jpg.

Figura 47. A influência do design no olhar de Arnold Newman transparece no retrato do arquiteto e paisagista Isamu Nogushi, de 1947.

Fonte: https://mymodernmet.com/wp/wp-content/uploads/archive/WZV02GwsxP9jXeaSXLKE_1082051107.jpeg.

O recorte depois de tirar a foto era um recurso muito usado pelo fotógrafo. Em imagens capturadas por câmeras de pequeno formato (como as DSLRs), esse procedimento pode comprometer a qualidade do trabalho, pois a imagem terá de ser muito ampliada, perdendo definição. Mas como Newman trabalhava com câmeras de grande formato (que produziam negativos enormes), podia cortar muito. O acesso às folhas de contato desse mestre da fotografia nos ajuda a entender seu processo de trabalho. No retrato de Picasso, também podemos ver claramente a importância do recorte para o fotógrafo.

Figura 48. Pablo Picasso, 1954. Foto de Arnold Newman.

Fonte: https://mymodernmet.com/wp/wp-content/uploads/archive/91youlDjx0PhzZlUkAWv_1082051034.jpeg.

Outra constante no processo de composição de Newman é o cuidado com os planos de fundo: isso pode ser observado nos retratos de alguns de seus pintores, como os mostrados abaixo:

Figura 49. Piet Mondrian por Arnold Newman. À direita, um quadro do pintor.

Fontes: https://i.pinimg.com/originals/b2/11/33/b21133f06d3c69eaba2c1f08bd91d0ab.jpg (foto); https://onlinequadros.com.br/static/acc/artist/ART-23448/gallery/47915/ART-23448_6Xjih9v3jczQ6JexStNH.jpg (quadro).

Figura 50. Georgia O'Keeffe por Arnold Newman.

Fonte: https://susanspiritusgallery.com/wp-content/uploads/2015/11/NPG_91_89_51-OKeeffe.jpg.

A simetria também está presente em algumas imagens de Newman, como no retrato de Leonard Bernstein, compositor, pianista e maestro. Nesta imagem, a simetria pode ser lida como um símbolo da disciplina de Bernstein em relação à sua profissão, enquanto o olhar sério e atencioso do maestro nos dá uma ideia clara do compromisso que ele tinha com a música. Além disso, a forma como as cadeiras vazias do auditório são iluminadas sugere como a audiência de Bernstein era importante para ele.

Figura 51. Bernstein, por Arnold Newman.

Fonte: http://k45.kn3.net/taringa/1/7/8/8/1/6/71/edf2012/97E.jpg?5064.

Figura 52. Newman guardava suas anotações, que escrevia meticulosamente, assim como seus esboços, que fazia com exatidão.

Fonte: https://media.npr.org/assets/img/2013/03/28/food_custom-65eef5efefa76cae9343c75bde4c787b2983f8df-s1600-c85.jpg.

 

T2. Retrato ambientado: técnicas e processos

T3. Objetivas e profundidade de campo

Retratos ambientados diferem dos retratos tradicionais nesse quesito: aqui, utilizam-se, geralmente, objetivas do tipo grande-angular (entre 18 e 35 mm). Além de mostrar mais o ambiente sem que o fotógrafo tenha que se afastar, estas distâncias focais aumentam o tamanho do que está situado em primeiro plano; desse modo, é possível destacar o personagem sem deixar de contextualizá-lo no cenário; ao utilizar esse tipo de objetiva, evite colocar o personagem nas bordas da imagem, o que poderia criar distorções. Diafragmas mais fechados são indicados para obter maior profundidade de campo, tornando nítidos o ambiente e os objetos importantes para a construção do sentido da cena.

T3. Composição

Uma técnica interessante em retratos ambientados consiste em explorar a geometria do espaço.

Fique atento à proporção entre o personagem e seu espaço de trabalho, de modo que tanto o rosto quanto outros detalhes (objetos cênicos escolhidos para descrevê-lo) fiquem evidentes.

T3. Preparação do ambiente

Antes de começar o ensaio em si o profissional deve explorar o potencial da locação, observando também as condições de iluminação. Uma dica é fotografar os cenários que se deseja utilizar sem o personagem neles, para entender como eles “rendem” na imagem.

Ambientes de trabalho não costumam ser visualmente limpos: contêm ferramentas, livros e outros objetos, o que pode dar um ar de bagunça à imagem. Se achar necessário, o fotógrafo pode – e deve – fazer pequenas interferências na arrumação do espaço, desde que isso seja negociado com o retratado. Isso também pode ser feito para aproveitar melhor a luz natural; por exemplo, mudando uma cadeira de lugar para que o modelo fique mais perto da janela. É possível, também, organizar os objetos ao redor do assunto, dispondo-os de modo que chamem a atenção do observador.

T3. Preto e branco ou cor

Às vezes, um ambiente muito colorido cria distrações do assunto principal, ou pode acontecer das cores não combinarem, “brigando” entre si. Nesses casos, pode ser mais eficiente trabalhar em preto e branco; porém isso deve ser acertado com seu editor de antemão. Se estiver fotografando em RAW, é possível fazer essa conversão durante o pós-processamento.